quinta-feira, outubro 30, 2003

AS MOSCAS NÃO SÃO AS DOS ANOS 60, POIS NÃO ?
Quando comecei este diário, não fazia ideia nenhuma do que queria cá dizer. Ainda hoje não sei muito bem, não é ?, mas a pouco e pouco acho que fui parar a uma forma simples de conversa com amigos, num café, uma espécie de vale-tudo desde que seja sentido. Qualquer coisa do género.
Claro que isto não surge por acaso, uma das recordações mais gratas da minha juventude são as conversas entre amigos, à volta de uma mesa de café, na Mexicana ou mais frequentemente na Copacabana, em Lisboa. Não era uma tertúlia intelectual, faltava-nos muita coisa para isso, mas era um convívio onde todos aprendiam com todos, numa partilha de informação e de ideias que bebíamos sofrêgamente em livros, reuniões, espectáculos, o que calhava.
Tínhamos vinte e poucos anos e andávamos, a maior parte, a estudar no IST, ali mesmo ao pé. Salazar ainda reinava, num país pachorrento, e a grande excitação das nossas vidas eram as lutas estudantis e a consciência do muito que seria necessário mudar a nível político. A guerra colonial era uma afronta “doutrinária”, para nós, e ao mesmo tempo uma ameaça real. Alguns lá foram cair, por essa Áfricas, enquanto outros, para a evitar, se viram obrigados a uma emigração forçada para a Suécia, Bélgica e outros países, interrompendo os cursos e as vidas. Mas isso são outras histórias, que um dia lhes contarei.
Por hoje, lembrei-me desta fase da minha vida apenas porque ela moldou definitivamente a minha maneira de pensar o Mundo, não como uma forma cristalizada e derradeira, mas antes como algo que se faz e desfaz para logo depois se refazer. Aprendi a ter prazer na conversa, no debate de ideias, no escutar dos outros.
Creio que este diário se está a parecer cada vez mais com aquelas conversas do final da década de 60. Em todos os aspectos. Incluindo a ideia de que muito há a mudar neste nosso país, em termos políticos.
Como dizíamos então, isto está uma merda completa.

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