quarta-feira, novembro 26, 2003

OS GOLPES URBANÍSTICOS E A TAÇA AMÉRICA
Afinal, a America Cup vai ser feita com base em Valência, Espanha e não em Lisboa/Cascais. E logo agora que convinha tanto a este Governo, arranjar assim uns balões de oxigénio virtuais.
É que, como toda a gente sabe, nós portugueses só progredimos quando temos grandes desafios pela frente : dêem-nos estádios para fazer, exposições para montar ou competições de vela para alojar e vão ver do que somos capazes ! Revolvemos tudo, desalojamos o que for preciso, projectamos, construimos, gastamos o dobro do orçamentado, arranjamos procedimentos sem nenhuma burocracia ( nem cautelas anti-corrupção, diga-se também ) mas fazemos mesmo, a tempo e horas. Agora sem a America Cup é uma tristeza, pá ... como é que vamos justificar os investimentos todos que já estavam na calha ? Como é que vamos convencer o Zé Povinho a gastar umas boas massas em mais um fabuloso empreendimento urbanístico, á beira do Tejo ( como o outro ), onde muito poucos dos pagantes poderão alguma vez sonhar em adquirir um lugarzinho ao sol ?
Ahhh, mas estou outra vez a ser velho do Restelo – expressão aqui muito pertinente, dado que tudo isto se vai passar perto da zona. A isto chama-se progresso, trata-se de restituir dignidade a uma zona do Tejo que está degradada e de pouco serve ...
Pois é. É sempre assim. Pouco ou muito, é sempre dinheiro público que é usado na urbanização de base destes espaços. Dinheiro público ... e espaço público, convirá não esquecer. E depois de tudo alindado e de tudo construido, quem pode comprar ali uma habitação, quem é ??
Ou seja, não é ao aproveitamento urbanístico dos espaços que me oponho, não haja qualquer confusão. Aquilo que me perturba é o mesmo velho fenómeno : a restituição desses espaços, depois de arranjados, a uma minoria muito minoria que pode pagar aqueles preços altíssimos. E não me venham dizer que o empreendimento se basta a si próprio e tem capitais privados lá metidos e que quem tiver dinheiro pode vir a comprar. É que o espaço é nosso !
Por outras palavras ainda mais simples : no fundo, apropriam-se de uma magnífica zona pública, urbanizam-a, embelezam-a e depois “entregam-a” a meia dúzia de abençoados pelo dinheiro.
Os outros ... podem ir até lá e passear um bocadinho. Desde que não sujem e não façam ondas. E viva o progresso !

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