terça-feira, março 16, 2004

HOJE NÃO TIVE ANGÚSTIAS E ALMOCEI BEM !

Há casas que falam, com eloquência, com amor mesmo. Já lá iremos, porém. Antes, queria falar-vos de um restaurante onde almocei hoje, com quatro velhos amigos. Foi no Painel de Alcântara, na Rua do Arco de Alcântara, em Lisboa. Ah, meus amigos e amigas, a velha cozinha tradicional portuguesa, como é boa ... um pernil do outro mundo, muito bem assado, com arroz e esparregado, e um divinal feijão branco guisado com entrecosto, chouriço e farinheira .....ehehehe, pois é, o colesterol, não é ?
Vejam aí ao lado como é a ementa deste velho restaurante de Lisboa e digam-me lá se não gostam ...
Não pensem que fomos uns alarves, éramos cinco e apenas mandámos vir duas doses, uma do pernil e outra do guisado, que as doses são tipo enfarta-brutos !
A conversa fluiu, leve, despreocupada. Uns beberam vinho tinto, bastante aceitável, servido num bonito jarro de barro vidrado. Outros foram para a água, que os problemas de saúde são chatos que se fartam. Não vi ninguém atacar doces, era tudo pessoal da pesada, daqueles que preferem o queijinho ao arroz doce ... cafés e águas finais e só saímos do restaurante lá pelas 3 da tarde.
Ah, esta maravilhosa sabedoria portuguesa de fazer da mesa um local de culto da conversa, da amizade ... e mesmo do amor, se lá quiserem ir com outra disposição e companhia ...
Entretanto, um desses meus amigos que mora em Algés, convidou-me a subir a casa dele ( eu tinha o meu carro estacionado ali perto ) para uma surpresa ....
Deixem-me dizer-vos que este meu amigo é de Lamego e a sua família tinha uma propriedade ( Lamego e Régua ) onde faziam vinho, o vinho fino, como se chama para aqueles lados. O vinho do Porto, para o comum dos mortais.
Pois bem, chegados lá acima diz-me ele : “Queres experimentar um vinho fino de ...1872 ? “ .... Tchiiiii, meu, 1872 ?? Sim, século XIX, pá !
A garrafa era ainda a original, o líquido côr de rúbi, o sabor esquisito, como se o tempo lhe tivesse dado um travo especial. Impressão minha, talvez, tive que repetir o cálicezinho para ter a certeza , ehehehe .... Muito agradável, a sensação.
E chegamos agora às casas que falam. A casa deste meu amigo fala de tempos passados, de coisas lindas que foram de avós e tios e tias, leques franceses, porcelana inglesa e do início da Vista Alegre, contadores de mogno, mesas de jogo cheias de truques e gavetas secretas, velhas camas com torneados e fresados, livros de outros séculos, que sei eu.
Não sei se estou a ficar mais sensível a estas coisas, com os anos, mas aquela casa seduziu-me. Toda ela respira tranquilidade e sabedoria. Paz interior. Beleza.
Regressei a casa mais alegre e reconciliado com a vida. Hoje nem me lembrei do tédio e das angústias... mérito dos amigos, do feijão guisado e do vinho fino de 1872 ... !

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