quarta-feira, abril 07, 2010

SOBRE A NATUREZA HUMANA

A primeira página do PÚBLICO de hoje suscitou-me algumas ideias que pensei em partilhar convosco.
Numa das notícias em destaque, dá-se conta das cheias provocadas no Rio de Janeiro por chuvadas intensas e prolongadas. A situação é muito má, arrasta-se há dias e é a história de sempre : a contagem já vai em mais de 100 mortos, casas em ruínas, carros destruídos, etc ... Claro que os directamente envolvidos são os mesmos de sempre, os mais desprotegidos, os que tiveram de construir as suas casas em locais totalmente inseguros, que mais ninguém quereria. No Rio de Janeiro, tal como na Madeira, quando chove em demasia o prejuízo não é igual para todos, há sempre aqueles que se lixam mais e são sempre os mesmos.
Outro pensamento não muito agradável que me ocorreu imediatamente, é que as mesmas situações ora são classificadas como tragédias, com direito a directos na TV, peditórios, arredondamentos e reconciliações políticas, se acontecerem no nosso quintal, perto de nós, como foi na Madeira, ou então são apenas fait-divers se acontecerem longe de nós, no quintal do vizinho.
Mas então as tragédias só o são se nos envolverem a nós ? Este egoísmo básico e primário sempre me irritou um pouco. Um enorme sismo no Chile ( hipótese ), mais de uma centena de milhar de mortos, mas, felizmente, não há portugueses entre eles ! Porreiro, pá !
Siga a marinha.
A outra notícia fala da completa "carnificina" que está a acontecer com as saídas da função pública. O fenómeno está explicado e ERA PREVISÍVEL. O Governo, no OE para este ano ( em processo de promulgação pelo Presidente ), passa a "multa" por cada ano abaixo do limite para a aposentação por inteiro para 6% em vez dos actuais 4.5%. Além disso, a própria base para cálculo da pensão muda, passa a ser o vencimento de 1995, corrigido com a inflação, em vez de ser o do último ano.
Claro, milhares de funcionários fizeram as contas e notaram que perderiam dinheiro se ficassem a trabalhar. Conclusão : está-se mesmo a ver que iria acontecer o que aconteceu, não é ?
E agora, leitor, pensa que os senhores do nosso Governo ficam atrapalhados e muito tristes ? Apesar de em alguns sectores terem que ir contratar pessoas ao estrangeiro ou aos já aposentados, como no caso dos médicos ?
Não, ficam todos felizes, apesar de gastarem mais dinheiro com a "jogada". Temos que pagar aos recém-aposentados, ainda que um pouco menos, mas temos que pagar a outros, contratados à pressa, para fazer o trabalho que estava a ser feito pelos primeiros. Significa que, em muitos casos, vamos pagar cerca do dobro que estávamos a pagar, não é ?
Ahhh, mas o Governo acha que está tudo como o ouro sobre azul, uma maravilha. No OE, o peso dos salários dos funcionários públicos no activo vai diminuir !! Maravilha, os outros, os que se aposentarem, ficam metidos no bolo das contas da Caixa Geral de Aposentações, já não chateiam tanto !!
Uma ultima pergunta : então e a mudança súbita das regras quase no fim do jogo, não é uma deslealdade, uma falta absoluta de respeito para quem trabalhou quase toda uma vida com outras regras ? Então isto não é uma quebra violentíssima da ÉTICA neste jogo da política ? Nunca Salazar ousou ir tão longe, na época, estas medidas eram sempre apenas aplicáveis às pessoas que entrassem no "sistema" numa dada altura posterior ... agora, não, mudam-se hoje as regras e é para já.
Um destes dias, os senhores acordam maldispostos e decretam que já ninguém tem direito a pensões de aposentação e ... pronto.

Muito mais haveria a dizer sobre estas duas notícias, eu sei. Mas sabem que mais ? Digam vocês, leitores, eu já fiz a minha parte ...

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