sábado, março 10, 2012

SERIEDADE, PRECISA-SE COM URGÊNCIA

O que diria o leitor se tivesse uns euros para investir e alguém lhe viesse dizer que estava disposto a garantir-lhe uma taxa de retribuição do seu capital de 10 ou 15% ao ano, sem qualquer risco para si ?
O leitor provavelmente desconfiaria da fartura e perguntaria o porquê da oferta, não é ? Bom, o seu interlocutor diria que não tinha capital disponível para o investimento, mas que precisava mesmo de fazer esse investimento e que conseguiria sempre pagar a "renda" anual.
Acharia bom, leitor ? Uma alta taxa de rentabilidade financeira com risco nulo ?
Pois bem, essa é exactamente a forma "habilidosa" como diferentes governos nacionais conseguiram fazer "obra", sem terem orçamento para isso, comprometendo-se depois a pagar quantias astronómicas, tudo somado, nos anos vindouros.
É a este "esquema" que se dá o nome de PPP - Parcerias Publico-Privadas : os privados investem, o Estado paga anualmente os seus lucros, o risco é nulo para o privado, os encargos avultadíssimos para o país.
Isto foi aplicado a auto-estradas, a hospitais, a pontes, à co-geração de energia eléctrica e a mais não são quantas outras áreas.
Esta solução é ruinosa e imoral. Ruinosa porque incentiva o poder político a lançar-se em projectos ( como é que pensam que o novo aeroporto iria ser construido ? ) para os quais de outra maneira não teria meios. Ruinosa porque sugere que podemos construir coisas sem dinheiro e depois logo se verá. Imorais porque proporcionam lucros certos e fabulosos às firmas das parcerias ( por exemplo a MOTA-ENGIL, não é ... ), sem qualquer risco envolvido, à custa dos mesmos de sempre.
Obviamente, o sistema agrada às firmas envolvidas e também aos políticos que aparecem com obra feita.
Um dos resultados desta história é a profusão totalmente absurda de auto-estradas neste país, circunstância que ameaçou o "negócio" no início, uma vez que a "renda" anual que o Estado pagaria ( nas ex-SCUT ) era calculada em função do número de carros a circular nas mesmas. Pobrezitos, lá foi necessário ( no final do reinado de Sócrates ) um Secretário de Estado vir alterar as regras do jogo e inventar uma forma de calcular a "renda" em função ... da disponibilidade ou potencialidade da autoestrada, e não dos carros que por lá transitam. Bom trabalho, o risco continua a ser nulo.
Pormenores. Tal como este outro pormenor, o "engano" recente de pagar duas vezes a mesma coisa à LUSOPONTE. Pagava-se-lhe uma compensação de cerca de 4 milhões de euros por não se pagar portagens na ponte em Agosto. Em Agosto ultimo o Governo acabou com a "borla", a LUSOPONTE recebeu as portagens ... e também a compensação por não as receber. Só mais 4,4 milhões de euros. Tudo pelos privados, ainda que tenhamos que ir buscar dinheiro à rapaziada que trabalha.
Será apenas amor à iniciativa privada ou favores a amigos ? Nem pensem, leitor, trata-se também de acautelar o futuro, quando sairmos da esfera pública e arranjarmos um qualquer lugarzito no Conselho de Administração de uma MOTA-ENGIL ou LUSOPONTE.
Digo-vos : em muitos anos de vida e uma atenção constante à coisa política, nunca como hoje presenciei uma tal degradação da ética e da honra. E dos ideais republicanos.
É vergonhoso. É assustador. É uma pouca-vergonha. Com hifen ou sem ele.
.
.

Sem comentários:

Enviar um comentário