terça-feira, maio 04, 2004

OS PORTUGUESES E O AMOR AO PORMENOR

Nós, os portugueses, somos assim.
Somos repentistas, improvisadores, desleixados, preguiçosos.
Temos um ódio visceral ao detalhe, ao estudo, à preparação do pormenor.
Falta-nos a paciência, o espírito de rigor.
Odiamos a matemática, adoramos o paleio gratuito.
Para nós, as coisas vão sempre correr bem, porque haveria de não ser assim ?
Para quê identificar as prováveis causas de erro e tomar medidas de antemão ? Se algo de menos bom acontecer, logo se resolve em cima do acontecimento.
Essas coisas de estudar os detalhes são para os povos do Norte, não habituados ao desenrascanço como nós. Nós não precisamos disso.

Segurança no Euro 2004 ? Concursos de Professores bem conduzidos ? Processos judiciais bem preparados e conduzidos ? Obras de construção civil bem projectadas, orçamentadas e sem derrapagens monstras nos custos ? Expo 98 sem esqueletos escondidos ? Futebol sem escândalos e corrupção ?

Quem pensar que pode responder sim a uma única das perguntas anteriores, não é português. Ou é mas nunca viveu em Portugal. Ou anda muito distraído.

A estas características do português comum, já de si nada recomendáveis, juntaram-se ultimamente algumas outras ainda piores.
Se for possível arranjar “algum” por fora, no exercicio da minha profissão ou através do poder que possuo, porque não ? Sou algum parvo ou quê ? Todos os meus conhecidos o fazem ... e se precisar de mentir e vigarizar para isso, qual é o problema ?

Beeeemmmm... nem sei que dizer. Odeio a maneira de ser lusitana, essa é a verdade. Nunca morri de amores pelos alemães ou pelos suecos, mas invejo o seu espírito, a sua determinação, a sua vontade de fazer tudo sem erros, tão perfeito quanto possível.

Será que amor ao pormenor e ao rigor naquilo que se faz é indissociável do frio e da falta de imaginação e alegria ? O nosso desleixo, apatia e desinteresse pela qualidade é o preço a pagar pela nossa exuberância, alegria, humor, gosto pela mesa e pelas coisas boas da vida ?
Recuso-me a acreditar nisso.
Penso que somos assim, mauzinhos naquilo que fazemos e desleixadinhos, porque nunca ninguém foi capaz de nos envergonhar suficientemente, porque nunca nenhum político soube ou quis promover os valores do rigor e da qualidade, porque nunca nenhum português acreditou que seriamos capazes de ser diferentes.
No fundo, no fundo, não serão estas características que explicam a miséria da nossa vida económica ?
Quem é que, na Europa ou no Mundo, compraria um automóvel construido pelos portugueses, oriundo de uma fábrica gerida por portugueses com normas de qualidade portuguesas ? ( Auto-Europas não valem ... ) Ou uma casa ? Ou seja o que for ?
É isso, é.
A miséria da nossa vida deriva directamente da nossa incapacidade de rigor e de amor ao pormenor e à qualidade do que fazemos.

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