sexta-feira, julho 16, 2010

O PAÍS DE ONDE A DECÊNCIA E A VERGONHA DESERTARAM

Dantes, há muitos anos atrás, havia vergonha na sociedade portuguesa. Muitos tipos de vergonha, salientemos : vergonha de ainda termos uma ditadura, em plena Europa, vergonha de termos uma guerra colonial, quando essa época já tinha passado em todo o Mundo. Vergonha também de se ostentar riqueza e de ganhar desmesuradamente, numa sociedade rural e extremamente pobre. Havia uma espécie de sentimento generalizado das conveniências e da proporcionalidade económica. Um gestor de topo de uma grande empresa, por exemplo, limitava-se a ganhar 500 quando o trabalhador ganhava 50.
Até os sonhos dourados eram contidos, nessa época, talvez pela restricção do exemplo de Salazar, ele próprio um homem sóbrio em gostos e poupado nos gastos.
Dir-se-à que Portugal estava parado no tempo.
Bom, tudo isso já lá vai. Feliz e infelizmente, tenhamos a coragem de o proclamar. Nem tudo melhorou, nem tudo foram cravos, as flores de Abril. À socapa, também nos chegaram muitas flores de cardo e azedas.
Assisti espantado e incrédulo à enorme vaga de egocentrismo, de falta de escrúpulos, de cupidez, de sem-vergonhice que caracterizou muita gente da classe média portuguesa, nestes anos pós Abril.
Era vê-los a rastejar, a implorar, a mendigar, a traficar, um lugarzinho bem remunerado para si e para os seus. Foi vê-los, despudoradamente, sem réstea de vergonha, a aumentarem-se a si próprios, a modificar os estatutos jurídicos das empresas para poderem auferirem salários principescos. Medíocres profissionalmente, a maior parte dessa gente, não qualificados para os lugares, era vê-los a saltitar de empresa pública em empresa pública, hoje nos transportes, amanhã nos cimentos, depois de amanhã na comunicação social, que interessa o sector, é tudo a fingir, é tudo para sacar umas massas !
A imensa mole dos chamados gestores públicos nacionais tem muito pouco de gestor e nada de nacionais. Recebem salários internacionais pela sua incompetência absurda e criminosa. São um grupo de pessoas a quem o País nada deve, muito pelo contrário.
E àqueles de vós que pensarem que estou a exagerar, eu lanço um repto : indiquem-me um nome, apenas um, desses pseudo gestores que tenha feito um bom lugar numa dessas empresas. Um que seja, para amostra. Pois é, não há.
Lembro-me bem do caso da TAP, quando o poder político desesperou e começou a perceber que a empresa se arriscava à falência imediata, com a incompetência do senhor Cardoso e Cunha, que de exploração de aviões sabia que eles tinham rodas ... Aí ( curioso, foi Santana Lopes ), foram obrigados a mandar o amador para a rua e a entregar a empresa a um ... brasileiro. Meu Deus.
Bom, adiante. Mas onde fui eu hoje buscar o "alimento" para esta diatribe ? A esta notícia : o seleccionador nacional de futebol vai receber um prémio de desempenho de 720.000 euros. Setecentos e vinte mil euros, quase 150.000 contos, pelo magnífico comportamento da nossa equipa nacional de futebol. Dois empates, uma vitória, uma derrota iguais a 720.000 euros !!
Estão agora a perceber porque fui buscar o passado ?
É que uma coisa destas, só é possível de acontecer porque esta malta, colectivamente, perdeu a cabeça, a noção dos valores ... e a vergonha.
Escuso-me de acrescentar aqueles indicadores todos da miséria nacional. Envergonho-me de falar no desemprego e na fome em muitos lares. Não quero ser demagógico, sei que quem me lê tem sensibilidade e conhecimento do estado do País.
Por isso, pergunto-vos : não vivemos tempos estranhos e sem vergonha ?

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