quinta-feira, fevereiro 14, 2008

UM INFELIZ CONVICTO

Não consigo ser feliz.
Nunca consegui, acho eu.
Oiço os outros falar da sua felicidade, das coisas que lhes dão prazer e só consigo pensar que não os entendo.
Se tenho tido ao longo da minha vida momentos de alguma alegria e esquecimento, tenho sempre a sensação que foram breves e um pouco por acaso.
Não gosto de muitas coisas que parecem agradar a quase todos os outros, o que é receita certa para não conseguir ligar-me bem a ninguém.
Não gosto de viajar, pelo menos da maneira que a maior parte gosta.
Não gosto de concertos de música séria, e fujo a sete pés dos outros, tipo Tina Turner em Alvalade.
Não gosto de teatro, óh blasfémia.
Não sinto prazer em ballet, clássico ou moderno.
Coisas como o flamengo fazem-me sono.
Nos ultimos tempos, dei por mim a aborrecer a praia, a achar estupido secar ao sol.
( Continuo a gostar do mar, mas isso não é popular ! )
Não me seduz o jogo, seja ele roleta ou slot-machines. Nem acho ponta de piada em ir jantar ao Casino e ver umas boazudas a rebolarem-se no palco.
Não gosto de conversas amáveis, desprovidas de emoção ou de polémica.
Não gosto de pessoas tolas, mesquinhas, egoistas ou que têm pavor da morte.
Odeio filmes tipo Harry não sei quantos, o jovem feiticeiro.
Sempre senti aversão pelo fado de Lisboa, nunca fui a uma casa de fados.
Odeio pessoas que dizem “está provado que” a anteceder uma qualquer afirmação patusca.
Odiei a Expo, percebi perfeitamente para que iria aquilo servir e a quem iria favorecer, nunca lá pus os pés.
Odeio a trafulhice, a mentira, a hipocrisia, o carreirismo, o partidarismo, o oportunismo, a mediocridade de valores.
Odeio os novos-ricos e também alguns dos velhos.
Odeio a maior parte dos padres e aquilo que esqueceram de Jesus Cristo, um dos meus heróis de puto.
Odeio muito daquilo em que Portugal se está a transformar.
Detesto festas com muita gente, todos muito determinados em se “divertirem”.
Sou indiferente a parques temáticos tipo Walt Disney.
As ultimas vezes que vi futebol só consegui pensar em árbitros venais e dirigentes corruptos. E jogadores pançudos de tanto dinheiro e tão pouco interessados em jogar futebol.
Conservo ainda valores dentro de mim, acho eu, mas já nem me lembro exactamente de quais.
Há ainda muita coisa de que gosto, claro, mas com todas estas coisas que odeio ou ás quais sou indiferente, como vou conseguir ligar-me aos que me rodeiam e ser “feliz” ?
Acham que alguém como eu, com tantos pontos negros, tantos “não gosto” e “odeio” poderia alguma vez ser feliz em Portugal ?

Acho que me vou resignar a ser infeliz.
Como sempre.

PS – Não tentem experimentar estas habilidades em casa, são coisas perigosas que só devem fazer na presença de profissionais qualificados em cinismo e em pessimismo e com todas as medidas de segurança activadas. Fiquem-se pelo gostar de todas estas coisas, é muito mais seguro.

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