segunda-feira, novembro 05, 2012

A MINHA LISBOA

Por vezes canso-me da política, da pequenez sórdida desta gente que se apropriou do país e deixo o meu espírito divagar por outras andanças.
Gosto de Lisboa. É a minha cidade. Embora aqui não tenha nascido, vivo em Lisboa há uns bons 50 anos. Conheço a cidade, claro, mas ainda há nela muitas coisas que me encantam e transportam para outros tempos, uns da minha juventude, outros de pessoas ilustres que por aqui deambularam, como Fernando Pessoa  ou Almada Negreiros.
Gosto de percorrer velhas ruas, de preferência sem saber muito bem onde vão dar, deixando os meus olhos absorver pormenores de múltiplas formas e cores. Águas furtadas forradas a chapa canelada de zinco, lá em cima, sabe-se lá quem lá mora, dorme e sonha. Lampiões de desenho antigo, fazendo-me lembrar os de gás, do tempo do terramoto. Varandas de pedra estreitinhas, com protecções de ferro forjado, castigadas pelos anos e chuvadas várias. Estores que se enrolam e desenrolam naquelas caixas metálicas exteriores, pintadas de um tom sujo que se adivinha já ter sido beige ou branco. Velhas mulheres com xailes à volta dos ombros, assomando de janelas do rés do chão, protegidas por meias sacadas de ripas pintadas de verde. Calçadas todas desniveladas, um grande alto aqui, uma poça cheia de água acolá, pedras polidas por gente que eu nunca conheci mas que posso perfeitamente imaginar. O sr. Cardoso, que tem um cafézito ali à esquina, a Dª Laura que é modista para fora, o sr. Joaquim, o dono do lugar de frutas e hortaliças, a Dª Eulália, viúva de um antigo embarcadiço das linhas de África. E tantas outras pessoas que por aqui fizeram as suas vidas e que, por isso mesmo, deram vida a estas ruelas.
E é assim que eu gosto de ver Lisboa, sem automóveis, nem bares finos, nem centros comerciais. Com gente modesta e humilde.
O pior é que, quando penso nestas gentes, me vem logo à ideia a seguinte questão : então esta gente é que viveu e vive acima das suas posses ? Foi esta gente que gastou à tripa forra e agora têm que pagar tudo à troika ??
Mau, amigos, lá se foi o meu tranquilo interlúdio com a política de lado. É inevitável regressar à selva em que esta gente nos mergulhou.
Paciência, até breve !

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