quarta-feira, fevereiro 04, 2009

AINDA SE APROVEITA ALGUMA COISA ?

Não me apetece escrever nada. Nem fazer nada. Só sinto uma profunda letargia. Sou um urso em hibernação. Palpita-me que estou acompanhado dos outros 9 milhões e meio de portugueses. Deixo de fora 500.000 que não são ursos. São aves de rapina. As aves de rapina não hibernam, não dormem e não descansam, sempre a pairar em círculos sobre tudo o que mexe, prontas a mergulhar e a afundar as suas garras em tudo o que valha a pena.
Já não sinto nada, o disjuntor central do meu cérebro disparou, a sobrecarga era exagerada. Nunca vivi nada de semelhante ao longo dos meus muitos anos de vida. Onde estavam escondidos, como apareceram, todos estes vampiros ? Quem lhes ensinou a arte, com quem aprenderam a usar os offshores, como perderam toda a vergonha ?
Que forças poderosas os movem, como conseguem usar as máscaras de gente séria e decente, que vento, chuva ou temperatura lhes permitiu desabrochar ?
Amigos, vá lá. Isto a que assistimos no nosso país não é obra de meia dúzia de corruptos. São muito mais que isso. É uma praga. A praga dos gafanhotos corruptos.
Sabe-se como começam, nunca se sabe como vão acabar. Começam nos partidos políticos, calmamente. Fazem-se notar, chegam-se aos chefes, abanam vigorosamente a cabeça, em sins ou nãos de enérgica concordância. Esperam a sua vez. Dão bicadas uns nos outros, como galinhas à espera do milho. Um dia são premiados, o chefe entrega-lhes um institutozito para dirigir (?) ou um lugarzito no Parlamento ou mesmo um lugar de director-geral. Um lugar onde normalmente dão largas à sua desesperada incompetência, a troco de uns milhares todos os meses, mais cartão de crédito e BMW. O pior nem é o dinheiro que estas sombras cinzentas consomem. O pior é que os organismos ou instituições por onde passam estiolam, apodrecem, ficam cada vez mais irremediavelmente atolados na lama.
Um dia, ahhhh finalmente, um dia deixam o governo ou o poder, com uma grande experiência … em tráfico de influências. Nesse dia, esfregam as mãos, chegou o momento tão ansiosamente esperado: um conselho de administração ( um ? Vários, como tantos casos que conheço ), numa grande empresa ou num banco.
A partir daí, mais nada por norma se conhece da vida deste promissor gestor. Apenas se sabe que, poucos anos volvidos, compra casas de meio milhão a vários milhões de euros, apresenta garagens com bentleys ou aston-martins ( os mercedes e bmw são muito foleiros para esta gente ), frequenta restaurantes que o leitor nem de nome conhece e torna-se, finalmente, uma pessoa de BEM.
Pensa que exagero, leitor ?
Oxalá assim fosse. É mesmo assim como lhe conto.
Ocasionalmente, um deles estampa-se ou é apanhado numa das reviravoltas dos jogos de poder e cai-lhe em cima uma sindicância, um inquérito, uma investigaçãozinha.
E depois, que mal tem isso ? São uns anitos um pouco chatos é verdade, mas a verdade vem longe e duvida-se que alguma vez se descubra. Com sorte, até os honorários dos advogados são pagos pelo Estado. E depois, há sempre uns sobrinhos ou primos na Suiça ou em Lisboa, dispostos ajudar a família, não é ?
Ahhh, agora vem outra verdadeira catástrofe : a justiça portuguesa. Toda a gente afirma a pés juntos que acredita na Justiça ( com J maiusculo ) e mais blablabla, enquanto esperamos anos e anos por ela, essa tal justiça.
Por mim, sou sincero, estou farto disto tudo. Dos corruptos, dos vigaristas, da política pequenina e também da justiça portuguesa. Acredito na justiça, mas apenas enquanto conceito teórico.
Na prática das nossas vidas, acho que a justiça portuguesa é ineficaz, demorada, por vezes estranhamente enviesada e parcial. Não acredito numa justiça que precisa que um vigarista abandone a presidência de um clube de futebol para o acusar. Não acredito numa justiça que anda ou não anda com os processos conforme os ventos que sopram do poder. Não acredito em deputados dependentes dos chefes dos partidos, em investigadores dependentes ou temerosos dos governos, em entidades de regulação não autónomas e de espinha curvada. Também não acredito em polícias, de investigação ou não, demasiado reverentes e atentas.
Portugal, tal como está, é um país sem espinha e sem projecto.
A culpa, como sempre, não é deles … é nossa.

Sem comentários:

Enviar um comentário